Conheça o projeto ‘Goiânia Invisível’ que conta histórias emocionantes de moradores de rua

Movimento que começou em São Paulo mobiliza o olhar da população para a situação de rua na cidade

Bianca Stephania Siarom
Por Bianca Stephania Siarom
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O Goiânia Invisível é um projeto social com o objetivo de ser a ponte entre a sociedade e pessoas em situação de rua. Os idealizadores acreditam que quando atravessamos essa ponte escutamos histórias de todo tipo, que são recontadas no Instagram a fim de mostrar à sociedade os vários e variados motivos que fazem uma pessoa perder tudo e passar a viver na rua ou como um andarilho.

O projeto social já existe em diversas capitais brasileiras como São Paulo, Rio de Janeiro, Natal (RN), Campo Grande (MS), Curitiba (PR) e Brasília, com o intuito de divulgar as histórias desses seres humanos, e também revelar a fragilidade das políticas públicas que os atendem – há um movimento de domesticação do morador, não de escuta. Esses homens, mulheres e crianças não estão nas ruas apenas por conta de drogas e marginalização, mas por falta de apoio familiar, problemas financeiros e estrutural.

Na capital goiana as visitas aos moradores são realizadas quatro vezes por semana e os voluntários além de coletarem a sensibilidade na fala das histórias, também levam alimentos, agasalhos e ítens de higiene, que é o que eles mais pedem e necessitam. “Eles dizem que tomar banho é como ter a dignidade de volta. É muito forte isso.” Afirma Ludymilla, uma das voluntárias.

“Para continuarmos com o projeto precisamos de ajuda, principalmente de empresas, padarias e buffets, com lanches que não seriam utilizados para levarmos para aqueles que sentem fome. Além do alimento precisamos de ajuda na campanha de arrecadação de itens de higiene, onde recebemos pasta e escova de dente, sabonete, absorvente e desodorante para montarmos os kits que levamos para as ruas.” Enfatiza Ludymilla.

Caso queira ajudar ou se tornar um voluntário, siga o movimento no Instagram, ou ligue para o número: (62) 99203-7111 e faça sua contribuição.

Confira alguns dos relatos mais emocionantes:

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Assim, eu moro na rua já tem 40 anos, moro na praça cívica desde os 2 anos de criança, eu me sinto uma pessoa já bem estruturada na rua. Vocês são meus colegas que trouxeram o alimento pra mim e eu agradeço em nome de Jesus, e eu falo assim não pelo alimento mas pela amizade de vocês, que vocês têm coração, tem coragem de chegar perto da gente, sentar com a gente e conversar com a gente. O que me faz mais falta é a atenção, o alimento nem tanto porque o alimento a gente busca e a gente consegue. O que falta é a atenção e tem o problema da polícia maltratando a gente, outro dia eles disseram que eu sou um lixo da sociedade, mas eu não sou um lixo. Eu sou um eleitor, tenho meu título, meus documentos. Candidato na porta dos colégios enche. Chegam falando: “Oh meu cidadão…” Meu cidadão?! Meu cidadão agora, hoje você pede meu voto e amanhã você manda a polícia me bater. Aqui na praça cívica de vez em quando tem umas brigas, eu não brigo com ninguém, mas eu tenho o braço quebrado, queria até pedir pra uma assistente social ajudar eu, pra mim não pagar uma passagem de ônibus porque eu tenho que andar de ônibus, meu braço não movimenta, ele é quebrado desde 2005 e eu nunca fui no medico e dói. Eulinho de Jesus, 42.

Uma publicação compartilhada por Goiânia Invisível (@invisivelgo) em 29 de Out, 2018 às 4:21 PDT

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Eu tenho 45 anos. Vou completar 46 no dia 30 de outubro. Se eu contar a minha história até o burro chora. Com 8 ‘ano’ de idade eu saí de casa. O meu pai só vivia me espancando. Eu não gosto nem de falar que dá vontade de chorar. Eu saí nesse mundo afora. Tem 35 anos que eu moro na rua. Muita gente já quis me matar, porque a rua que vocês estão vendo agora é essa. Eu quero ver vocês passarem um dia na rua com ‘nóis’. É horrível. E ‘o seguinte é esse’: o bagulho é louco. Você é uma lei da sobrevivência. . Eu não sei como contar isso aqui, porque eu já sofri muito. Não tem aquele dia lá que o Gugu falou assim ‘sentindo na pele’? Sentindo na pele porra nenhuma, não. Eu quero que ele passe uma noite na rua. Porque quando você chega na rua, igual eu… Tenho carrinho, com a minha cachorra, eu tenho que caçar o canto exato pra eu dormir. Porque os próprios morador de rua rouba os próprios morador de rua. Então você tem que caçar um canto, um local, uma razão. E se você quiser me ajudar de verdade: tá vendo aquele carrinho de supermercado? Eu estou querendo uma bicicleta pra pegar a BR. Eu não tô querendo uma Caloi, uma mountainbike igual esses playboyzinho. Eu quero uma Monarque, porque a Monarque, é essa aí que aguenta a BR. Não precisa ser nova. Quanto mais velha, melhor ainda. Aí eu vou botar meu caixote, aquele que tá lá na frente lá. Eu conheço 25 estados. Eu já fui hippie na vida, esse couro de jacaré aqui, ó, o único que eu tava. Aí o seguinte é esse: eu deixei de ser hippie porque tem uma lei muito fluminosa com eles lá. Porque quando não gosta de você, toma tudo que você tem. Aí eu fui e deixei de ser hippie. Eu já andei em São Paulo, Rio de Janeiro, Maceió, Campinas, João Pinheiro, Minas Gerais. Aí eu estou em uma precisão mesmo, de verdade, é de uma bicicleta. Eu não quero pra eu viver, eu quero pra eu ir pra BR. Tenho minha barraca aqui, de 4 lugares, que eu ganhei. Então eu quero minha bicicleta, pra eu ir ‘simbora’. Reginaldo (45 anos) e Catrina.

Uma publicação compartilhada por Goiânia Invisível (@invisivelgo) em 18 de Out, 2018 às 10:00 PDT

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É bom conhecer nossa história pra não entrar na vida que estamos, porque esse caminho é muito triste. Eu entrei no mundo das drogas quando separei da minha esposa. Encontrei um amigo, igual esses caras aqui da rua. Cara que é “amigo”, né? Tinha uns 18 anos. E foi uma droga atrás da outra e roubando o que é dos outros. Sou do Maranhão, cheguei em Goiânia em 2009. Aqui eu conheci o terror da droga, sofri muita coisa. Já apanhei, fui preso, já passei medo de morrer sem saber se ia dormir e amanhecer vivo. Tenho a perna quebrada, a barriga aberta a cabeça quebrada, tudo por causa do vício; Já fiquei 12 dias em coma, quando passei a mão na cabeça eu chorei demais, porque foi uma coisa que eu mesmo causei. Deixei a droga falar mais alto, mas Deus chama, ou vem pela dor ou pelo amor… e até agora ainda não procurei um lugar para agradecer à Deus e servir à Ele e esquecer tudo do mundo, é muito difícil, porque sozinho quem é drogado não consegue; A recuperação tem que vir de nós mesmos, de nossa vontade, mas é muito difícil largar. Hoje puxo reciclagem, cato papelão, latinha, lata, pra poder me manter, sobreviver, eu e meu cachorro o Gigante. Minha vida é essa, não é ruim só em termo do vício e da casa, de não ter, ficar na rua, e aqui você é sujeito a tudo. Você morre sem saber porquê; morre dormindo, não tem tranquilidade, acontece com muitos. Todo dia quando acordo, falo com Deus, agradeço pelo dia que amanheceu, e pela minha vida, porque ele me deu minha vida de volta. Eu estava muito desesperado, muito louco por causa da droga. Sabe um carro descontrolado que perde o freio? Estava igual. Goiânia é bom, eu vim para cá e gostei. O povo daqui tem um coração muito bom. Eles fazem por carinho, por amor, porque sabe que precisamos. O dia que não vier, tá bom também; Outro dia vem. Igual o banho, sábado tem banheiro, toma banho, pegar roupa limpa, barbeador, sabonete; Todo sábado. O dia que não vem, tá bom, amém; Nem todo sábado a pessoa está disposta a ajudar, tem que descansar, está certo. Eu gosto daqui, e podem vir sempre. As portas estão abertas. “Faísca”, 32.

Uma publicação compartilhada por Goiânia Invisível (@invisivelgo) em 22 de Ago, 2019 às 6:30 PDT

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Vim para rua por causa do meu pai e a minha madrasta que me humilhava, ela falava: “vai buscar teus trapos no varal”. Meu pai aprendia meu documento, pegava minha aposentadoria e não me dava quase nada, então fui embora, faz uns dez anos que estou na rua, já estive em Palmas, Petrolina, Minas Gerais, São Paulo já estive em algumas pousadas, abrigo, albergue, faz uma semana que eu sai da casa da Acolhida. Não sou usuário, não tenho nada contra quem é, sou psicótico tomo remédio para dormir, e tenho problema psiquiátrico. Sou natural do RJ, nasci na praça Mauá, criado em Nilópolis eterno Beija Flor baixada fluminense, os meus dois filhos e os netos estão lá e tenho parente que eu nem conheço, sou avô de seis netos por parte do meu filho, minha filha não quis ter filho até hoje ela tem 36 anos e não quer cuidar de mim, diz que já sou de maior, talvez é algum preconceito pelo meu problema, e vou vivendo a vida, sou um homem do bem, só faço o bem, ajudo no que eu posso, mesmo da minha pobreza ajudo o mais pobre que eu, ajudo o ser humano praticando o bem que nem vocês praticam; As vezes dou dinheiro quando preciso dar de doação, alimento também, que a obra de Jesus que eu saiba é essa: dar de comer quem tem fome e beber quem tem sede. É a obra de Deus, Jesus falou na bíblia, e quem pratica o bem ganha muito mais galardão com Deus né? Enquanto eu for vivo vou só práticar o bem e só isso, desejo tudo de bom para vocês e pratiquem o bem. Juarez, 59 anos.

Uma publicação compartilhada por Goiânia Invisível (@invisivelgo) em 2 de Jul, 2019 às 2:03 PDT

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O espírito da depressão entrou em mim, meu comportamento mudou e fiquei triste. Eu vi, mas não pratiquei mal nenhum, deixei 03 carros na época, cheio de roupas, dinheiro, máquinas de costura e então a ré me pegou mas Deus me levantou. Estou uma pessoa assim, com a mão machucada o cachorro mordeu, pés rachados, dois dedos quebrados, tenho Hepatite, diabetes, infecção, mas estou tratando bebendo raiz do mato. Vigio carros todos os dias e não vou na casa de ninguém, parente nenhum, nem na rua eu passo. Tem tanta rua pra eu passar. Eles sabem onde estou e passam 05 anos sem vir me ver e tudo mora em Goiânia. Fui um bom irmão, bom amigo, bom vizinho, ganhava muito dinheiro e vou voltar a ganhar honestamente, desonesto Deus não confia. Minha história de vida é levantar à noite de baixo de chuva e socorrer os mendigos. Eles não veem eu secar o corpo, tirar da chuva e trocar a roupa, agora eu não posso trocar por que eu não tenho nem pra mim. Cuido de 43 cachorros e trabalho dia e noite, nunca tive férias desde os 05 anos quando fui trabalhar na roça, já fui caminhoneiro, montador de torre, furava buraco para poste, roçador de foice, de tudo eu fazia. Fazem 10 anos que moro na rua. O pobre miserável está sofrendo, eu sei o que o povo precisa, ando os 04 cantos de Goiânia. O pobre que está na miséria precisa de emprego, remédio, papel higiênico, maquinário novo para trabalhar, vai lá no cais ver se não está uma multidão agora e não tem equipamento. Vê se tem remédio que é R$10 reais e o município não tem. O que estão fazendo com o dinheiro? Eu sou Hepatite B e cadê o acompanhamento? Não tem. Vou tomar chá de picão e Deus vai me curar. Até agora não ganhei nada de ninguém; Ah não, o Pedro Henrique me deu almoço na mãe dele, a Naiara, a Márcia remédios e comida, o povo me dá as coisas, não posso falar isso… o povo! Não estou falando de prefeitura, políticos e governantes, desses não recebi nenhuma balinha, só promessas. José, 59 e Roberto Carlos. AJUDE O PROJETO CONTINUAR, COLABORE COM A NOSSA VAKINHA: http://vaka.me/470776

Uma publicação compartilhada por Goiânia Invisível (@invisivelgo) em 25 de Mar, 2019 às 2:40 PDT

Capa: Invisível GO | Divulgação